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CHIARI OU MÁ-FORMAÇÃO DE CHIARI TIPO 1

Má-formação ou Malformação de Chiari (ou simplesmente Chiari) é quando uma parte atrás do cérebro, chamada de cerebelo, desloca-se para baixo em direção à coluna cervical. Muitos médicos acreditam que isso ocorre quando a pessoa tem a região traseira do crânio deformada ou menor do que o habitual, e isso acabaria pressionando o cerebelo forçando-o para baixo. Geralmente, é considerada um problema congênito, ou seja, a pessoa já nasce com essa alteração. Porém, também existem casos adquiridos, ou seja, que o deslocamento do cerebelo ocorre ao longo da vida.

Muitas pessoas com má-formação de Chiari não apresentam nenhum sintoma e nem necessitam de qualquer tipo de tratamento durante toda a vida. Entretanto, alguns pacientes podem apresentar sintomas como dor na nuca, dor no pescoço e dor de cabeça desencadeadas pela tosse. Em casos mais acentuados, também pode haver dificuldade no equilíbrio, nistagmo (movimento anormal dos olhos), dormência e fraqueza nos quatro membros. Em algumas situações, o tratamento cirúrgico pode ser necessário.

A malformação de Chiari é um problema raro, mas o seu diagnóstico vem aumentando consideravelmente à medida que os métodos diagnósticos de imagem, principalmente a ressonância magnética, vem se desenvolvendo. 

A seta mostra o sentido do deslocamento do cerebelo em direção coluna cervical na

Malformação de Chiari tipo 1

Cerebro e cerebelo no Chiari 1.jpg

Hans Chiari

Captura de Tela 2022-07-25 às 15.36.51.png

O patologista alemão Hans Chiari foi quem descreveu pela primeira vez em 1890 algumas anormalidades na região da junção do crânio com a coluna cervical. Ele classificou essas alterações em quatro tipos conforme a gravidade, mas, atualmente, consideramos apenas os tipos 1 e 2, pois os outros são extremamente raros.  

Assim como a maioria das patologias congênitas, o paciente que nasce com má-formação de Chiari pode apresentar outros distúrbios associados, como defeitos na formação de outros ossos do crânio e da coluna, lesões cutâneas e hidrocefalia, por exemplo. 

Professor Hans Chiari

Junção crânio-cervical normal

Normalmente, o cerebelo fica contido inteiramente na cavidade craniana. As tonsilas cerebelares, uma de cada lado, são as extremidades inferiores do cerebelo. São elas que se deslocam inferiormente saindo do crânio e adentrando o canal vertebral no Chiari 1. 

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Chiari tipo 1 RM.jpg

A: cerebelo normal

B: junção crânio-cervical normal

Chiari Tipo I

  • Chiari tipo I — é a variação mais comum e se desenvolve à medida que o crânio e o cérebro estão crescendo. Com isso, os sinais e sintomas podem aparecer só no final da infância ou já na idade adulta. Sua característica principal é a descida de dois pequenos lóbulos do cerebelo, um de cada lado, chamados de “tonsilas cerebelares.” Elas se deslocam do crânio para dentro do canal vertebral.

Tonsilas cerebelares na má formaçao de Chiari tipo 1

A: Cerebelo normal

B: Chiari tipo I 

Deslocamento do cerebelo que ocorre na Má Formação de Chiari do tipo I 

Chiari Tipo II

  • Chiari tipo II ou Arnold-Chiari — A forma pediátrica, malformação de Chiari tipo 2, está presente ao nascimento (congênita). Além das tonsilas cerebelares, também ocorre o deslocamento de parte do cerebelo e do bulbo através do forame magno, o orifício inferior do crânio.  

  • Chiari tipo III e IV — congênitos e extremamente raros.

chiari tipo 2 cerebelo herniado.jpeg

B

Chiari tipo 2 RM.jpg

Fig. C e D. Má Formação de Chiari tipo II

B

Desde a descrição inicial do professor Hans Chiari, muitas teorias foram formuladas para tentar explicar a herniação das tonsilas cerebelares. Atualmente, sabemos que a pessoa com má-formação de Chiari, pode possuir também pequenas alterações nos ossos da junção crânio cervical. Além disso, a cavidade localizada na nuca, chamada de fossa posterior, costuma ser menor que o habitual nesses pacientes. Com isso, foi levantada a hipótese de que o cerebelo desloca-se para baixo porque não cabe naquela cavidade pequena. Porém, uma fossa posterior menor não leva, necessariamente, à má-formação de Chiari.

A má-formação de Chiari é uma condição ainda muito mal compreendida. A mera presença de tonsilas cerebelares deslocadas para baixo não  o distúrbio de Chiari I; tonsilas baixas são comuns e geralmente assintomáticas.

Sintomas

Na cavidade da fossa posterior está o cerebelo, responsável pelo equilíbrio do corpo e coordenação motora dos braços e pernas. Quando ele se desloca para baixo, em direção à abertura que comunica o crânio com a coluna cervical, alguns problemas podem aparecer. Embora existam relatos de casos com apresentação sintomática súbita, geralmente o início dos sintomas no Chiari tipo I é gradual. A queixa mais frequente é dor de cabeça, especialmente na nuca. Os principais sintomas são:

  • dor de cabeça intensa (sobretudo na nuca)

  • dor no pescoço 

  • fraqueza de um ou mais membros

  • dormência em um ou mais membros

  • desequilíbrio

  • tonteira

  • alteração da sensação de temperatura

Sintomas em adultos

Os adultos com Chiari, de forma geral, apresentam a má-formação do tipo 1. Os sintomas são variados e costumam manifestar-se após os 20 ou 30 anos.   

 

A dor de cabeça associada ao esforço físico, além de ser o sintoma mais frequente de todos, é o sintoma mais característico da malformação de Chiari. Ela está relacionada com o distúrbio da circulação do liquor (líquido que fica em volta do cérebro e da medula).  Outros sintomas incluem distúrbios do equilíbrio, da visão e da audição. 

A manobra de valsalva (esforço com a respiração presa) pode desencadear a dor de cabeça, como ao tossir ou evacuar, por exemplo. 

Os pacientes podem apresentar dores de cabeça provenientes da malformação de Chiari, mas também podem ter enxaqueca ou dores de cabeça comuns secundárias a stress, períodos de jejum prolongados, bebida alcoólica, etc.

Os pacientes com Chiari tipo I que tem dor de cabeça, são considerados sintomáticos quando essa dor apresenta algumas das características consideradas compatíveis com a malformação.  Dentre essas características da dor, podemos citar:

  • curta duração

  • ser desencadeada pelo esforço físico ou pela manobra de Valsalva, como na tosse, por exemplo

  • não apresentar características de enxaqueca

Outros sintomas que são tipicamente atribuídos ao Chiari tipo I podem estar presentes, porém são mais raros, incluem apneia do sono, dificuldade de deglutição, zumbidos, diminuição da frequência cardíaca, além de escoliose e distúrbios motores ou sensoriais nas extremidades naqueles pacientes com siringomielia espinhal associada.

História natural

A história natural da malformação de Chiari permanece com muitos aspectos ainda sem solução. Como a tendência natural é que os pacientes mais sintomáticos sejam operados, não se sabe ao certo qual seria sua evolução sem o tratamento cirúrgico no longo prazo.

Por outro lado, muitos pacientes assintomáticos, ou com sintomas mais leves, têm sido objeto de estudos cujo objetivo é avaliar sua evolução sem cirurgia. Atualmente, já é possível dizer que a história natural nesse subgrupo tende a ser benigna.

Existem relatos tanto de melhora quanto de piora do quadro ao longo do tempo. Entretanto, a parcela que evoluiu positivamente é bem maior. Existem inúmeros relatos não só de alívio dos sintomas como também de melhora radiológica (na ressonância). Ou seja, já se observou que, em alguns casos, as tonsilas cerebelares apresentam redução do seu deslocamento inferior. Essa ascensão ocorre principalmente em crianças.

Diagnóstico

O exame de escolha para avaliar pacientes com Chiari é a ressonância magnética (RM) do crânio. A coluna cervical também deve ser avaliada para descartar siringomielia. Nessas malformações, o principal achado nos exames de imagem é o deslocamento inferior das tonsilas cerebelares. Também observa-se o apagamento da coluna de liquor na região do forame magno e da primeira vértebra cervical (C1).

De modo geral, quando as tonsilas estão deslocadas mais do que 5 mm, elas apresentam um formato pontudo, indicando compressão (em crianças pode ocorrer um deslocamento maior sem compressão, portanto, sem sintomas). No entanto, esse tipo de medida é menos importantes do que a real aparência dessas estruturas. Particularmente, os pacientes com pequenos deslocamentos das tonsilas, sem sinais de compressão das mesmas e sem apagamento do espaço subaracnoídeo, não precisam de investigação nem tratamento.

A compressão das vias de circulação liquórica pode levar à formação de siringomielia na coluna cervical. Se a passagem do liquor pelo canal central da medula fica comprometida, ele pode ficar acumulado. Isso leva à dilatação desse canal, chamada de siringomielia. Consequentemente, pode ocorrer compressão da medula e a pessoa apresentar sintomas como dormência e fraqueza nos quatro membros.

 

Outra alteração secundária aos distúrbios da circulação liquórica é a hidrocefalia. 

Captura de Tela 2022-07-25 às 12.20.11.png

(a) Apagamento da coluna liquórica e tonsila cerebelar pontuda (seta) são sinais claros de compressão. Observa-se siringomielia (setas duplas). (b) Em outro paciente, apesar de a tonsila não ter a morfologia pontuda e seu deslocamento ser discreto (6 mm), ainda é possível o aparecimento de siringomielia (seta).

Tratamento

A indicação do tratamento cirúrgico na má-formação de Chiari é baseada nos achados clínicos, não nos achados radiológicos. O tratamento depende dos sintomas e da gravidade do caso. A cirurgia tem o objetivo de aumentar o espaço da fossa posterior e aliviar a pressão exercida sobre o cerebelo. Para isso, o neurocirurgião remove uma parte do osso do crânio e de uma ou mais vértebras cervicais.

Um estudo descobriu que 0,9% dos adultos normais submetidos a exames de ressonância magnética do crânio tinham hérnia tonsilar estendendo-se mais de 5 mm abaixo do forame magno. Portanto, como já foi mencionado, o simples achado de deslocamento das tonsilas não significa que a pessoa necessariamente precise da cirurgia.

A parte em azul nessa figura representa a região do crânio e da coluna cervical removidas na cirurgia

osso retirado na cirurgia de chiari

A presença de sintomas nem sempre se correlaciona com a percepção da necessidade de tratamento cirúrgico. Ocasionalmente, pacientes e cirurgiões podem optar por acompanhamento sem cirurgia até mesmo nos casos sintomáticos, caso os sintomas sejam leves. Em uma série de 147 pacientes acompanhados após uma decisão inicial de tratamento não cirúrgico, apenas 14 pacientes, ou seja, 9%, foram submetidos à cirurgia em algum momento durante um intervalo de acompanhamento de seis anos.

Geralmente, é considerada indicação de cirurgia quando o paciente com Má-Formação de Chiari I apresenta siringomielia, pois isso indica haver compressão significativa das vias de circulação do liquor na região do forame magno (transição crânio-cervical). Nos pacientes com Chiari I sem siringomielia, a cirurgia é indicada quando há sinais de distúrbio cerebelar, compressão do tronco encefálico ou nistagmo (movimentos anormais dos olhos).

 

Quando o paciente apresenta cefaleia suboccipital (nuca) desencadeada pelo esforço, a cirurgia pode ser indicada, pois esse sintoma costuma ser aliviado pela descompressão da fossa posterior.

Para a indicação da cirurgia, o neurocirurgião também pode considerar alguns achados radiológicos que podem indicar que as tonsilas estão realmente causando impacto na junção crânio cervical:

 

  • Tonsilas em forma de pino, ao invés de arredondadas

  • Estreitamento das vias liquóricas no forame magno

  • Deslocamento das tonsilas por mais de 12 mm

Pacientes que apresentam sinais e sintomas de mielopatia como alteração da força e da sensibilidade nos membros, devem ser operados. O tratamento cirúrgico tem o objetivo de evitar o aumento da lesão e a piora dos sintomas. Os pacientes podem até melhorar após a cirurgia, mas é mais comum ficarem com sequelas. 

Por isso, quando há indicação de cirurgia, esta não deve ser postergada, pois a demora no tratamento pode acarretar piora dos déficits ou perdas irreversíveis das funções neurológicas.

 

Sintomas cerebelares de desequilíbrio também costumam melhorar, mas nem sempre são totalmente eliminados.

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